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Texto pronto para revisão

 

Seja ao escrever textos literários, seja ao preparar uma obra acadêmica, um dos momentos mais difíceis para o autor é decidir se o trabalho está completo. Em outras palavras, esse é o momento de determinar se o texto está pronto para ir para a revisão.

Um dos erros mais comuns cometidos por quem escreve é acreditar que a revisão pode resolver problemas de estrutura no texto. Não é para isso que serve uma revisão de texto. O revisor pode ajudar o autor a identificar e solucionar falhas na coesão e/ou na coerência textual, além de resolver quaisquer pendências de digitação, pontuação e concordância que o autor tenha deixado passar, mas não há nada que mesmo o melhor dos revisores possa fazer diante de problemas estruturais no texto.

Uma analogia simples pode nos ajudar a visualizar como funciona esse processo. Vamos imaginar o escritor como um engenheiro, e o texto que ele está escrevendo como uma obra que está sob sua responsabilidade. Assim como existem diversos tipos de textos literários (romance, conto, poema etc.) ou acadêmicos (artigo, TCC, dissertação etc.), existem vários tipos de construção (prédio residencial ou comercial, shopping center etc.). Independentemente do tipo de construção, no entanto, uma vez que a obra está finalizada, é chegada a hora de contratar uma equipe de limpeza, para deixar tudo brilhando antes da “entrega das chaves” ao feliz proprietário. Você já deve ter adivinhado que, no caso do texto, o equivalente dessa “faxina” é justamente a revisão, que é responsável por passar aquele “pente fino” que detecta e remove até as menores imperfeições.

Agora imaginemos a seguinte situação problemática: quando a equipe da faxina chega à construção, descobre que algumas paredes ainda não foram pintadas. Ou pior: falta colocar alguns ladrilhos no assoalho. Ou pior ainda: parte da rede de encanamento não foi instalada. Em qualquer uma dessas situações (altamente improváveis no campo da construção civil), é fácil perceber como o trabalho da equipe de limpeza não só será de pouca valia, como terá que ser refeito depois que as falhas estruturais da obra forem corrigidas. Fazendo a analogia com o campo da produção de textos (onde esse tipo de problema, infelizmente, acontece com muita frequência), fica mais evidente a importância de saber exatamente quando um texto está pronto para ser revisado.

Apresentamos a seguir três estratégias simples, mas bastante eficazes, que podem ajudá-lo nessa espinhosa tarefa.

 

Algo está faltando no texto? Lendo como um “alter ego”

 

Uma das maiores dificuldades para o autor é detectar lacunas em seu próprio texto. Isso acontece porque a obra existe de forma completa na mente do autor, de onde ela veio em primeiro lugar, antes de ser convertida em texto. Assim, diante de qualquer salto na narrativa (no caso de textos literários) ou na sequência de exposição de fatos ou argumentos (no caso de textos acadêmicos), existe o risco de que a mente do autor vá inconscientemente suprindo a informação que falta no texto. Esse é um erro mais comum do que se pensa.

Existe um exercício imaginativo que pode ajudar a perceber “buracos” em seu texto. Chamamos essa técnica de ler como um “alter ego” (literalmente, um “outro eu”), porque ela consiste basicamente nisso: ler o texto tentando se colocar no lugar de uma outra pessoa, que nada sabe sobre o que está escrito ali. Isso permite não só identificar elementos problemáticos no texto, como, da mesma forma, vivenciar com mais intensidade os seus pontos fortes. Vale a pena experimentar esse recurso tão simples, mas que pode melhorar muito a qualidade de seus textos.

É claro que esse exercício de se imaginar como um “alter ego” nunca poderá ser feito de forma completa, pois não temos como esquecer voluntariamente o que já sabemos. Mas é possível exercitar de forma consciente esse olhar de uma pessoa estranha ao texto, lendo de forma mais lenta e deliberada e, a cada momento, se perguntando: “com base apenas no que foi lido até aqui, o texto está claro e completo? Há alguma informação faltando?”.

Se não houver pressões de prazo para a entrega do texto final (o que costuma acontecer com muita frequência, especialmente com textos acadêmicos), uma dica para maximizar os efeitos positivos desse exercício é deixar o texto “descansando” por alguns dias (ou até semanas, se achar necessário). Retornar à leitura depois de passar algum tempo com a mente desconectada daquele texto específico pode facilitar a se aproximar do estado ideal de alguém que está lendo aquilo pela primeira vez.

 

Algo está sobrando no texto? Exercitando “a arte de cortar palavras”

 

Outra deficiência muito comum na estrutura do texto decorre do problema oposto, que é ter elementos em excesso. Nos textos de ficção, por exemplo, às vezes o autor se encanta com determinado personagem, cenário ou episódio, e acaba se estendendo neles além do recomendável. No caso dos textos acadêmicos, existe a tentação de inserir um trecho desnecessário para poder  acrescentar mais um livro à bibliografia ou mesmo apenas para aumentar o número de páginas. Via de regra, aqui ficam mais claros os efeitos nocivos de elementos excessivos no texto, pois geralmente são esses trechos sobressalentes que costumam ser alvos de ataques impiedosos por parte da banca examinadora! Contudo, mesmo no caso dos textos literários, que normalmente não são escrutinados por especialistas em busca de defeitos e pontos falhos, o melhor é se desfazer de tudo o que não for necessário em seu texto.

Aqui devemos nos firmar na sábia máxima de Carlos Drummond de Andrade: “escrever é a arte de cortar palavras.” Existe uma maneira certa e segura de colocar esse ensinamento em prática. Leia o texto que você escreveu. Se notar algum trecho ou elemento que possa estar sobrando, isso por si só é um forte indício de que ele deve ser cortado. Mas a prova definitiva é mesmo suprimir essa parte e ver como o texto funciona sem ela. Se o texto continuar funcionando, certamente a parte que você cortou não fará a menor falta.

Para se aprofundar um pouco mais nesse tema tão importante, confira o que disse Aristóteles sobre a unidade da ação.

 

Algo que não conseguimos perceber no texto? Pedindo “ajuda aos universitários”

 

Principalmente no caso de textos literários, pode ser muito útil recorrer a leitores-beta para ajudar a detectar falhas estruturais no seu texto. Um leitor-beta é alguém que lê o seu texto em primeira mão, antes que seja publicado (e, preferencialmente, antes mesmo que vá para a revisão).

Existem leitores-beta profissionais, que podem ser contratados, mas nada impede que você peça a amigos e a familiares para desempenharem esse papel. É importante apenas que essas pessoas tenham consciência de que estão lendo o seu texto não na condição de familiares e de amigos, mas na de leitores-beta, com a responsabilidade de ajudá-lo a perceber pontos falhos no texto. Um leitor-beta que só tem elogios a fazer pode ser algo muito agradável, mas não ajuda muito na tarefa de tornar o texto melhor.

 

A importância de revisar o texto depois de pronto

 

Depois de passar por tantas etapas de aprimoramento, será que ainda é necessário levar o texto a um profissional de revisão? Existe uma dinâmica de grupo que demonstra bem como é importante ter o seu texto revisado por um especialista.

Imagine que você está em um grupo de dez ou mais pessoas. A pessoa que está conduzindo a dinâmica coloca na testa de cada participante um adesivo que pode ser azul, vermelho ou amarelo. Em seguida, é formulado o desafio: sem falar uma única palavra e sem se olhar no espelho, cada pessoa deve descobrir qual é a cor do adesivo em sua testa. Como você faria para descobrir a cor de seu adesivo?

Nessa dinâmica, geralmente as pessoas levam algum tempo tentando adivinhar cada um a sua cor, sem sucesso. Até que alguém tem a ideia salvadora e começa a ajudar as outras pessoas a descobrirem sua cor, conduzindo as pessoas com adesivo vermelho para outras com adesivo da mesma cor, e assim por diante. A dinâmica termina quando o grupo inicial está dividido em três grupos, em que todos sabem qual é a sua cor por estarem inseridos no subgrupo amarelo, azul ou vermelho.

E é então que é apresentado o mote da dinâmica: tem coisas que só descobrimos com a ajuda dos outros.

Essa é uma verdade que se aplica especialmente à revisão de textos. Por mais que nos esforcemos para encontrar e corrigir falhas, todos nós temos uma “área cega”, que só pode ser identificada com o auxílio de terceiros.

Vendo essa mesma questão por um outro prisma, voltemos à analogia da revisão como uma faxina. Tal como uma faxina bem feita, uma boa revisão não é percebida por quem chega de fora. Uma pessoa que visita uma casa que passou por uma boa limpeza provavelmente vai reparar na arquitetura, nos móveis dessa casa, no cenário que se vê pelas janelas, ou mesmo na personalidade dos anfitriões. O mesmo acontece com uma pessoa que lê um texto que passou por uma boa revisão: ela irá notar a construção das frases, o encadeamento das sentenças, a progressão da narrativa e uma infinidade de outros detalhes valiosos. Agora, experimente não fazer a faxina em uma casa. Essa será, provavelmente, a primeira coisa que as pessoas irão notar ao visitar essa casa. Lamentavelmente, a mesma coisa acontece com textos que alguém não revisou.

Por essas e outras é que tanto a revisão quanto a faxina devem ser feitas sempre que possível!

 

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